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Carta aberta à sociedade:


A Sociedade Brasileira de Herpetologia - SBH, pessoa jurídica de direito privado inscrita no CNPJ sob o nº 04.132.217/0001-06, entidade que congrega pesquisadores e outros profissionais que atuam na pesquisa, no manejo e na conservação de anfíbios e répteis do Brasil, vem a público se manifestar sobre a crescente busca pela criação de serpentes em cativeiro com o objetivo de comercialização de veneno. Contamos nesse manifesto com o importante apoio do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Répteis e Anfíbios - RAN/DIBIO/ICMBio, responsável por coordenar a elaboração dos planos de ação voltados para conservação da herpetofauna brasileira.


A criação de animais silvestres em cativeiro com finalidades comerciais é uma atividade amparada pela legislação brasileira. Está sujeita ao processo de licenciamento pelos órgãos ambientais estaduais, tendo por base a apresentação de um projeto de criação que deve ser assinado por profissional habilitado e amparado pela respectiva Anotação de Responsabilidade Técnica. Desta forma, quando submetida ao processo de licenciamento e aprovada pelas autoridades competentes, a criação de serpentes é uma atividade legalmente admitida no país, sujeita a normas técnicas específicas.


Recentemente, a abertura de criatórios de serpentes com fins comerciais tem sido incentivada com a oferta de cursos, geralmente de curta duração, veiculados e comercializados nas redes sociais e em sites. Nesses cursos, a atividade é vendida como extremamente lucrativa, realizada a partir de projetos de baixo custo de implantação e manutenção, com garantia de obtenção de licenças e lucro em curto prazo. Estes cursos ainda sugerem que o mercado de veneno está em crescimento e que animais utilizados como matrizes podem ser obtidos com facilidade por meio de doações de instituições públicas, e até mesmo por meio de coletas de animais na natureza. Estas promessas têm atraído interessados, inclusive em comunidades rurais.


Para fins de esclarecimento, a propaganda veiculada por estes cursos, assim como as informações divulgadas em seu conteúdo, não condizem com a realidade da realização da atividade. A implantação de um serpentário não se configura como atividade de baixo custo, uma vez que se faz necessária a instalação de sistema de prevenção de disseminação de doenças, berçários e recipientes isolados para recém-nascidos e filhotes com temperatura e umidade controlados, biotério para a produção de camundongos, laboratório destinado à extração e beneficiamento de veneno além de um sistema eficiente de tratamento de efluentes de todas essas instalações. A infraestrutura deve necessariamente atender a todas as normas de segurança e prevenção de contaminação de materiais e equipamentos, condições que estabelecem um custo elevado de planejamento, implantação e manutenção. Somam-se aos custos apresentados os honorários mensais de um responsável técnico pelo empreendimento, devidamente registrado junto ao conselho federal de sua carreira, bem como aqueles referentes à supervisão de um médico veterinário, que monitore e assegure as condições sanitárias dos animais mantidos em cativeiro.


Por sua vez, é importante destacar que criadouros comerciais necessitam de grande quantidade de animais. Os órgãos ambientais não dispõem de matrizes para doação em larga escala, e tão pouco autorizam a coleta em grande quantidade de espécimes na natureza. Sobre o mercado, embora os venenos de serpentes possam de fato ter um valor significativo, as grandes empresas produtoras de medicamentos têm gerenciado seus próprios criadouros (inclusive, no exterior ou com tecnologias avançadas). Além disso, o mercado não se apresenta promissor, uma vez que muitas frações dos venenos têm sido produzidas de maneira sintética, o que poderá gerar redução da demanda em médio prazo.


Desta forma, a SBH vem a público informar e manifestar-se contrariamente à propaganda e veiculação dessas informações em cursos, que, como cediço, não representa a realidade e perpetuam informações inacuradas, sem maiores rigores técnico e científico, o que pode, em tese, configurar até mesmo a exploração da boa-fé alheia. Acreditamos que serpentários possam, sim, ser criados com atendimento correto à legislação e às normas técnicas. Entretanto, o respeito às normas e diretrizes aplicáveis se faz extremamente necessário.


Por fim, recomendamos que, previamente ao investimento em cursos ou atividades dessa natureza, ocorra a consulta aos órgãos ambientais, conselhos de classe e demais entidades responsáveis evolvidas para entendimento das reais limitações que estes projetos apresentam.



Denise de C. Rossa Feres

p/ Sociedade Brasileira de Herpetologia - SBH

www.sbherpetologia.org.br


E


Rafael Antônio M. Balestra

p/ RAN/DIBIO/ICMBio

www.icmbio.gov.br/ran



Baixe o comunicado oficial AQUI